Poesia

Milagre de merda

Balthasar Denner [A Gardener], 1735 (Detalhe)

Terna flor
Que adornada de esterco
De dejetos fétidos
De abortos intestinais
De desarranjos, não arranjos
Do putre rejeito dos corpos
Cresce linda e cheirosa
A despeito e por causa
Dessa massa fedorenta

Sem pudor
Se abre sobre o chão nojento
Desnuda-se em pétala
E, na beleza das cores
Vívidas
cerra o cortejo das moscas
e faz inveja às borboletas

Qual será Tua sina?
Enfeite de mausoléu?
Presente para amante?
Motivo
De sorriso de criança?
Inspiração para poetas?

À merda as utilidades
Ignoras todas elas
segues alheia aos olhares
Serves tua ceia às abelhas
Que, do vômito, farão doce mel
Mel oriundo de adubo
Imundo sepultado na terra

Enquanto musa de muitos
que decidiram não considerar
que sob tuas raízes de planta
Divides tua ração com vermes
transformas refugos, rejeitos
Em pétala suave e singela
Que amolecerá, da donzela, o seio
Que o patrão levará na lapela

Anderson C. Sandes e Éder Rafael — Fevereiro de 2016

Publicado por Anderson C. Sandes

Poeta, cronista, ensaísta, autor de Baseado em Fardos Reais; Arte e Guerra Cultural: preparação para tempos de crise; organizador da Antologia Quando Tudo Transborda. Pedagogo. Vivo de poesia pra não morrer de razão.

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