Fichamentos e Resenhas

Cartas do Inferno, ou Cartas de um diabo a seu aprendiz — C. S. Lewis

A obra consiste em conselhos de um diabo para seu diabo aprendiz, onde o maior na hierarquia dá ensinamentos de como o menor pode fazer seu “paciente” humano a afastar-se de Deus.

Prefácio

Há dois erros iguais e opostos no que diz respeito à matéria Demônios: Uma é desacreditar em sua existência. A outra é acreditar e sentir um excessivo e doentio interesse neles.

Introdução

Chesterton disse que Satanás caiu pelo efeito da Força da Gravidade.

Nota do leitor: Na obra Ortodoxia.

[…] qualquer ser que possa amar ainda não é um diabo.

Os maus anjos (à semelhança dos maus homens) tem espírito puramente prático.

Deus torna homens em servos, e estes servos em filhos, de modo a serem no final reunidos a Ele […]

[…] embora seja fácil levar a mente a raciocinar diabolicamente, isso não proporciona prazer, ou pelo menos não por muito tempo.

CARTA Número III

Quando dois seres humanos viveram juntos por muito tempo, usualmente aparecem tons de voz e expressões faciais de um que quase enlouquecem de fúria ao outro.

[…] um humano diz coisas que visem ofender ao seu próximo e depois se mostrem indignados quando o próximo se manifesta de fato ofendido.

CARTA Número IV

[…] podemos persuadi-lo de que a posição corporal não faz diferença em suas orações; pois eles constantemente se esquecem de que são animais, e por isso tudo que seus corpos fazem afeta suas almas e espíritos.

É divertido como os mortais sempre nos pintam como “colocando coisas em suas mentes”: na realidade, nosso melhor trabalho consiste justamente em evitar que certas coisas cheguem a suas mentes.

A mais simples destas formas é desviar a contemplação deles do Inimigo para eles próprios.

Nota do leitor: O inimigo aqui ė Deus.

CARTA Número V

Não espero cabeças amadurecidas sobre ombros ainda jovens.

CARTA Número VI

A grande jogada é dirigir a malícia para seus vizinhos mais próximos (do tipo que ele veja todo dia) e dirigir sua benevolência para um círculo distante e para pessoas que ele sequer conheça.

CARTA Número VIII

Nós queremos criar gado que finalmente nos sirva de alimento; Ele quer servos que mais tarde converterá em filhos. Nós queremos sugá-los, Ele quer premiá-los; nós somos vazios e queremos nos encher através deles, Ele é pleno e assim transborda.

CARTA Número IX

Não o deixe sequer suspeitar da existência da Lei da Ondulação. Deixe-o assumir que os primeiros ardores de sua conversão deveriam permanecer indefinidamente, e mostre-lhe que deveriam, mas passaram, e portanto a atual situação de sequidão e indiferença é uma condição igualmente permanente. Uma vez que tenha colocado essa mentira na mente dele, você pode agir de várias maneiras.

CARTA Número XI

Eu divido as motivações para o riso humano em Exprimir Alegria, Se Divertir, Achar Graça e Zombaria ou Irreverência.

O riso por causa de razões assim não é bom para nós, e por tanto deve ser sempre desencorajado. Além do mais, trata-se de um fenômeno nojento e um insulto direto ao realismo, dignidade e austeridade do Inferno.

A simples covardia é profundamente vergonhosa. Mas se a adornarmos com um monte de gracejos e comentários exagerados (tipo brincarmos com um soldado que fugiu e abandonou seus companheiros numa hora difícil, dizendo que ele tem medo das baratas do quarto, e o mesmo fazendo caretas quando comentassem) a covardia se tornará como num passe de mágica apenas uma coisa engraçada.

A crueldade é terrível para os humanos, e inaceitável, a menos que o homem cruel possa ser representado de forma cômica e espalhafatosa.

Nota do leitor: Não existe tirania no mundo que resista a uma gargalhada que dê três voltas em torno dela. (Molière)

A leviandade é ótima, em todos os aspectos. Fica a milhares de quilômetros da verdadeira alegria, e ainda tem a vantagem de não despertar nenhum afeto entre as pessoas do grupo que a estão exercitando.

CARTA Número XII

[…] a monotonia da rotina habitual faz com que os prazeres provenientes da vaidade, excitação e irreverência se tornem cada vez menos aprazíveis e cada vez mais difíceis de se abandonar (pois é exatamente isto que o hábito rotineiro faz com qualquer prazer)

“Eu agora vejo que gastei a maior parte da minha vida fazendo nada do que eu queria ou gostava.”

Assassinato não é melhor que jogo de cartas se as cartas podem realizar o engano.

Com efeito, a estrada mais segura para o Inferno é a gradual – a ladeira suave, com chão suave, sem curvas acentuadas, sem avisos de quilometragem e sem placas indicativas de sinalização.

CARTA Número XIII

[…] você permitiu, primeiramente, que o paciente lesse um livro do qual realmente gostava, apenas por gostar dele, e não para fazer comentários espertos sobre o livro com os novos amigos.

A grande característica nos prazeres e nos sofrimentos é que eles são insofismavelmente reais, e, portanto, não importa quão longe eles consigam ir, eles proporcionam ao homem algo como uma “caída de ficha” para comprovação da realidade.

[…] quando os homens se rendem totalmente a Ele passam a ser mais do que eram anteriormente.

O homem que verdadeiramente e desinteressadamente aprecie qualquer coisa no mundo apenas por causa dela mesma, sem estar preocupado em coisa alguma sobre o que os outros pensem a respeito, estará muito bem armado contra alguns de nossos mais sutis métodos de ataque.

Como um dos seres humanos mesmo disse, os hábitos ativos são fortalecidos pela repetição, ao passo que os passivos se enfraquecem pela mesma continuidade. Quanto mais vezes ele se sentir inativo, menos ele se disporá a agir, e ao longo do tempo, menos ele conseguirá sentir alguma coisa.

CARTA Número XIV

Todas as virtudes são menos formidáveis assim que o homem percebe que as têm, mas isto é especialmente marcante com relação à humildade!

Nota do leitor: A humildade é uma virtude apenas enquanto o homem que a tem não sabe que é humilde. Depois que sabe, torna-se vaidade.

Ele os conduz a se considerarem arquitetos e poetas excepcionais por alguns instantes, para em seguida se esquecerem disso, enquanto nós fazemos de tudo para os humanos se concentrarem, gastando muito tempo e dores pensando neles mesmos como coisas péssimas.

CARTA Número XV

Em resumo, o Futuro é, de todas as coisas, o que menos se parece com a Eternidade. Ela é a parte mais cabalmente temporal do tempo – pois o passado está definido e não flui mais, e o presente está totalmente sob o brilho dos raios eternos de luz. Partindo deste fato, temos encorajado fortemente as doutrinas como a Evolução Criadora, o Humanismo Científico ou o Comunismo, os quais fixam sempre a atenção dos homens no Futuro. Daí decorre que praticamente todos os vícios tem suas raízes no Futuro.

A Gratidão olha para o Passado e o amor enfoca o Presente; mas o medo, a avareza, a luxúria e a ambição sempre estão olhando para frente.

Nós queremos essa raça de vermes inteira perseguindo perpetuamente o pote de ouro no fim do arco-íris, nunca sendo honesta, nunca sendo generosos, nem felizes agora, mas sempre usando todos os talentos que lhes foram dados no presente como combustível depositado no altar onde cultuam o futuro.

CARTA Número XVIII

Conseguimos isso por meio dos poetas e os novelistas, convencendo aos humanos de que uma curiosa, e geralmente efêmera, experiência que eles chamam “estar apaixonados” é a única base respeitável para o matrimônio; de que o matrimônio pode, e deve, fazer permanente esse entusiasmo; e de que um matrimônio que não o consegue deixa de ser interessante.

Ele mesmo, sendo uma mera unidade aritmética; pretende ser três ao mesmo tempo que um, com o fim de que esta tolice do Amor possa encontrar um ponto de apoio em Sua própria natureza.

Nota do leitor: Chesterton diz que Deus não é um gigante no universo amando a si mesmo. Sua natureza de três seres (pai, filho e espírito santo) em unidade revela o amor. Deus é, em si mesmo, o amor.

Agora vem o bom do assunto. O Inimigo descreveu ao casal casado como “uma só carne”. Não disse “um casal felizmente casado”, nem “um casal que se casou porque estava apaixonado”, mas se pode conseguir que os humanos não tenham isso em conta.

[…] e o “amor” será usado para desculpar ao homem de toda culpa, e para lhe proteger de todas as conseqüências de casar-se com uma pagã, uma idiota ou uma libertina.

CARTA Número XXI

Aos homens não irrita a mera desgraça, mas sim a desgraça que consideram uma afronta.

O que o tira do equilíbrio é o visitante inesperado (quando havia uma promessa de noite tranqüila), ou a mulher faladora de um amigo (que aparece quando ele desejava ter uma conversa particular com o amigo).

CARTA Número XXIII

Na última geração, promovemos a construção de um destes “Jesuses históricos” segundo pautas liberais e humanitárias; agora estamos oferecendo um “Jesus histórico” segundo pautas marxistas, catastrofistas e revolucionárias.

Nota do leitor: Ou um Jesus revolucionário.

Em lugar do Criador adorado por sua criatura, logo tem meramente um líder aclamado por um partidário, e finalmente um personagem destacado, aprovado por um sensato historiador.

Os primeiros conversos foram convertidos por um só feito histórico (a Ressurreição) e uma só doutrina teológica (a Redenção), atuando sobre um sentimento do pecado que já tinham; e um pecado não contra uma lei inventada como uma novidade por um “grande homem”, mas sim contra a velha e tópica lei moral universal que lhes tinha sido ensinada por suas babás e mães. Os “Evangelhos” vêm depois, e foram escritos, não para fazer cristãos, mas sim para edificar aos já cristãos.

CARTA Número XXIV

É sempre o novato o que exagera. O homem que subiu na escala social é muito refinado; o jovem estudioso é pedante.

[…] o mais poderoso e o mais belo dos vícios: o Orgulho Espiritual?

CARTA Número XXV

O que nos convém, quando os homens se fazem cristãos, é mantê-los no estado de ânimo que eu chamo “o cristianismo e…”. Já sabe: o cristianismo e a Crise, o cristianismo e a Nova Psicologia, o cristianismo e a Nova Ordem, o cristianismo e a Fé Curadora, o cristianismo e a Investigação Psíquica, o cristianismo e o Vegetarianismo, o cristianismo e a Reforma Ortográfica. Se tiverem que ser cristãos, que ao menos sejam cristãos com uma diferença. Substituir a fé verdadeira por alguma moda de aparência cristã. Trabalhar em cima de sua aversão ao Mesmo de Sempre.

CARTA Número XXVI

Assim, enquanto que a mulher pensa em fazer boas obras e o homem em respeitar os direitos de outros, cada sexo, sem nenhuma falta de razão evidente, pode considerar e considera ao outro radicalmente egoísta.

CARTA Número XXVII

[…] porque o Inimigo não prevê os humanos fazendo suas livres contribuições no futuro, mas sim os vê fazendo-o em seu Agora ilimitado. E, evidentemente, contemplar um homem fazendo algo não é obrigá-lo a fazê-lo.

CARTA Número XXVIII

A prosperidade une um homem ao Mundo. Sente que está “encontrando seu lugar nele”, quando na realidade o mundo está encontrando seu lugar nele.

Notará que os jovens geralmente resistem menos a morrer que os maduros e os velhos.

Um grande filósofo humano quase revelou nosso segredo quando disse que, no referente à Virtude, “a experiência é a mãe da ilusão”;

Nota do leitor: Acho que foi Kant.

CARTA Número XXIX

Para ser enorme e efetivamente mau, um homem necessita alguma virtude.

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Publicado por Anderson C. Sandes

Poeta, cronista, ensaísta, autor de Baseado em Fardos Reais; Arte e Guerra Cultural: preparação para tempos de crise; organizador da Antologia Quando Tudo Transborda. Pedagogo. Vivo de poesia pra não morrer de razão.

2 comentários sobre “Cartas do Inferno, ou Cartas de um diabo a seu aprendiz — C. S. Lewis”

  1. Estevão Agostinho Chapanga disse:

    Feliz

  2. Valdineia disse:

    Estou lendo, tenso viu

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