Poesia

Um chapéu

Jean-Louis Forain [Behind the Scenes], 1880 (Detalhe)

Um bom homem deve levar
Na cabeça um bom chapéu
Tira-se o chapéu
Para respeitar alguém
Ou um ambiente respeitável
À moça que passa
Ao rapaz que observa
À nave da capela

Com um bom chapéu
Um bom homem abana a face
Alivia a dor ao fechar
Os olhos com a brisa austera
Do chapéu

Um bom homem deve levar
Na cabeça um bom chapéu
Para contar histórias
Enquanto agita levemente
O acessório que esteve
Em cada uma das aventuras
Sente-se prazer ao desnudar do chapéu
Refresca, alivia
Sente-se prazer ao cobrir-se com o chapéu
Aconchega, conforta

Um bom homem deve levar
Na cabeça um bom chapéu
Para repousar sobre o peito
A fim de repousar também a si
Para ocultar a face, por vezes
A fim de obscurecer a vista e,
Também repousar a si

Um bom homem deve levar
Na cabeça um bom chapéu
Para dar olhar linheiro sob sua aba,
Como que desconfiado,
Ou cansado da caminhada
Ou à procura de alguém
Para respeitar

Um bom homem deve levar
Na cabeça um bom chapéu
Pois nos aparenta
Pingos de sabedoria
Dá elegância viril
Faz recordar o cheiro
De nosso avô

[…]

Andamos uma milha a mais
Do que foi-nos pedido a andar

Mas não se enganem
Quem acha que chapéus servem
Apenas para coisas assim tão importantes
Por vezes até nos abrigam
Desse sol de meu Deus,
Que lambe meu sertão

E eu que, nem sou um bom homem
Nem tenho um chapéu tão bom assim
Recomendo aos demais:
Levem na cabeça um bom chapéu
[Faz recordar o cheiro de nosso avô]

Anderson C. Sandes — Fevereiro de 2020

Publicado por Anderson C. Sandes

Poeta, cronista, ensaísta, autor de Baseado em Fardos Reais; Arte e Guerra Cultural: preparação para tempos de crise; organizador da Antologia Quando Tudo Transborda. Pedagogo. Vivo de poesia pra não morrer de razão.

5 comentários sobre “Um chapéu”

  1. Luis Manoel Siqueira disse:

    Poema pronto. E que mexeu com minhas memórias.
    Não há nada de “medíocre” em você.
    Retire isso de sua apresentação.
    Parabéns.

    1. EDUARDO PENNA disse:

      Concordo com você: Nada há de medíocre no Sandes. Medíocre sou eu. Mas, Graças a Deus, pessoas como o Sandes cruzaram o meu caminho e continuam a cruzar, fazendo com que eu saia do caminho da mediocridade. Obrigado Anderson Sandes! Abraço do parceiro de MBC Eduardo Penna

  2. ANGÉLICA M S EDUARDO disse:

    Parabéns Anderson, muito bom!

    1. Murilo Arthur disse:

      Fantástico

  3. Silvana Andrea Appio disse:

    Ao ler, tive um vislumbre de você observando ao longo dos anos, cada gesto descrito na figura do seu avô…Muito sentimento exposto… Lindo.

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