Poesia

Sublimação

Joshua Reynolds [David Garrick Between Tragedy and Comedy], 1761 (Detalhe)

A tinta que ora jorra o impresso
fora hemorrágica em outrora,
pulsa produtividade tal
da inatividade vital de agora.
Ah, vintém poupado ao bolso,
não vai ao divã, ao fosso,
sublimou da mágoa ao gozo
o dente amarelo restaurado.

A gota salgada que cai,
[pela vontade: não vai, não cai!]
faz-se doce ao temperar do verso.
Vira o inverso, não coube ali,
dá-lhe doce a arripunar:
Tomai, tomai! fresquinho
o sumo do olhar calado.

E a tortura do ponteiro miúdo?
O roxo da olheira graúdo?
O arrancar dos cabelos da nuca?
A calvície sobre a massa caduca?
O fungado antes do galo da madrugada?
O temor da chegada alvorada?
Não sai dos poros nenhuma aflição
que pena vil não torne em canção.

Anderson C. Sandes — Março de 2022

Publicado por Anderson C. Sandes

Poeta, cronista, ensaísta, autor de Baseado em Fardos Reais; Arte e Guerra Cultural: preparação para tempos de crise; organizador da Antologia Quando Tudo Transborda. Pedagogo. Vivo de poesia pra não morrer de razão.

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