Conto

A árvore de Natal na casa de Cristo — Fiódor Dostoiévski

Bartolomé Esteban Murillo [O Pequeno Mendigo], 1645-55 (Detalhe)

Havia num porão uma criança, um garotinho de seis anos de idade, ou menos ainda. Esse garotinho despertou certa manhã no porão úmido e frio. Tiritava, envolto nos seus pobres andrajos. Seu hálito formava, ao se exalar, uma espécie de vapor branco, e ele, sentado num canto em cima de um baú, por desfastio, ocupava-se em soprar esse vapor da boca, pelo prazer de vê-lo se esvolar. Mas bem que gostaria de comer alguma coisa. Diversas vezes, durante a manhã, tinha se aproximado do catre, onde num colchão de palha, chato como um pastelão, com um saco sob a cabeça à guisa de almofada, jazia a mãe enferma. Como se encontrava

Fichamentos e Resenhas

O Trabalho Intelectual — Jean Guitton

Inicio aqui a leitura e fichamento da obra “O Trabalho Intelectual”, do Jean Guitton, pela editora Kírion. Palavras-chave: #Intelectual #Estudo #Leitura #Trabalho #Descanso

Epígrafe: “As verdades mais preciosas são aquelas que se descobrem por último; mas as verdades mais preciosas vêm a ser os métodos”. — Nietzsche 

Conto

O sonho de um homem ridículo — Fiódor Dostoiévski

Vasily Perov [Retrato de Dostoiévski], 1872 (Detalhe)

Narrativa fantástica, 1877.

I

Sou um homem ridículo. Agora já quase me têm por louco. O que significaria ter ganho em consideração, se não continuasse sendo um homem ridículo. Mas eu já não me aborreço por causa disso, agora já não guardo rancor a ninguém e gosto de toda a gente, ainda que se riam de mim… sim, senhor,  agora, não sei por quê, mas sinto por todos os meus próximos uma ternura especial. Teria muito gosto em acompanhá-los no vosso riso… não precisamente nesse riso à minha custa, mas sim pelo carinho que me inspiram, se não me fizesse tanta pena vê-los. É pena que não saibam a verdade. Oh, meu Deus! Quanto custa isso de ser um só a saber a verdade! Mas isto não compreendem eles. Não, nunca compreenderiam isto.

Poesia

Chega a noite

Vincent van Gogh [Starry Night Over the Rhône], 1888 (Detalhe)

Chega a noite
Vão-se as moscas
Voltam-se os mosquitos
As primeiras zumbirão suas filosofias
Larvais em outros ares
Os segundos querem sangue
E ferem mais fundo
Mais profundo na gente
Que bate, que bate
Que mata

Poesia

Caraibeira

Vincent van Gogh [The Large Plane Trees], 1889 (Detalhe)

Qual caraibeira florescida
com vagens verdinhas e longas
surgi, depois d’um inverno quente
e longo verão brasil.

Poesia

Bole bole, criança

Candido Portinari [Roda infantil], 1932 (Detalhe)

Esses terreiros tortos
com crianças buliçosas só têm aqui!
Pr’acolá pode ter… mas não é igual,
boa bagunça e gritaria só em nosso quintal.

Poesia

Das memórias que perdi

Hendrik G. Pot [The Coin Collector], 1655 (Detalhe)

Quem seria eu agora,
sem saber quem fora em outrora?
Se dantes fui moço,
tento debalde recordar das paixões…
[…] oxalá! Que eu tenha tido, meu Deus!

Poesia

Pouco sou

Jean-Honoré Fragonard [Young Girl Reading], 1770 (Detalhe)

Por mais que eu foleasse
todas as páginas,
me enterrariam sem
de nada eu saber.
Mas de um nada muito grande…